Considerando
que
o desprezo e o desrespeito pelos avessos humanos resultam em atos
bárbaros que ultrajam a inconsciência da humanidade,
Considerando
fundamental
que os avessos humanos sejam protegidos pela liberdade de fala, para
que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião
contra a tirania e a opressão racional,
Considerando
essencial
promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as
instâncias psíquicas,
Considerando
que
uma compreensão comum desses avessos é da mais alta importância
para o pleno cumprimento desse compromisso,
A
teoria psicanalítica proclama:
A
presente Declaração Universal dos Avessos Humanos como o ideal a
ser atingido por todos que forem povos desejantes, com o objetivo de
que cada sujeito, tendo sempre em mente esta Declaração, se
esforce, através do desejo de saber, por promover o respeito a esses
avessos.
Artigo
1º
Todas
as pessoas nascem desamparadas. Não são dotadas de razão e
consciência a priori, pois ambas são construções sociais, e
deveriam agir em relação umas às outras com espírito de
fraternidade, depois de sofrerem as consequências da civilização
recalcadora.
Artigo
2º
Toda
pessoa pode gozar dos avessos, sem distinção de qualquer espécie,
seja de raça, cor, sexo, língua, alíngua, religião, opinião
política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza,
nascimento, ou qualquer outra condição.
Artigo
3º
Toda
pessoa tem direito ao avesso, à pulsão de vida/morte e à
insegurança pessoal.
Artigo
4º
Nenhuma
palavra será mantida em escravidão ou servidão; a escravidão das
palavras será proibida em todas as suas formas. Deve-se falar o que
vier à cabeça, sem censura.
Artigo
5º
Ninguém
será submetido à tortura do sintoma, nem ao tratamento ou castigo
cruel do gozo.
Artigo
6º
Toda
pessoa tem o direito de ter avessos, em todos os lugares, reconhecida
como sujeito perante a lei do pai.
Artigo
7º
Todos
são desiguais perante a lei paterna e não têm direito, sem
qualquer distinção, de bulir com a mãe da horda primeva.
Artigo
8º
Toda
pessoa tem direito a procurar remédio, nem sempre efetivo, para seus
sintomas ou atos próprios ou alheios que violem os avessos
fundamentais que lhe sejam reconhecidos por esta Declaração.
Artigo
9º
Ninguém
deveria ser calado pelo recalque, detido ou exilado de si, mas todos
são. Ninguém é dono de sua própria morada.
Artigo
10º
Toda
pessoa tem direito a uma audiência imparcial por parte de seu
analista, o que não válido para o julgamento feito pelo superego,
para decidir sobre seus avessos ou do fundamento de qualquer
autoacusação.
Artigo
11º
§1.
Toda pessoa acusada de um ato delituoso, delirante ou não, tem o
direito de ser presumida culpada até que a sua inocência tenha sido
construída de acordo com as elaborações em análise, em julgamento
privado.
Artigo
12º
Ninguém
será sujeito a interferências na sua vida privada, nem mesmo pelo
analista.
Artigo13º
§1.
Toda pessoa tem direito à liberdade de locomoção, ainda que
sofra de conversão histérica.
§2.
Toda pessoa tem o direito de deixar qualquer lembrança para trás,
mas nada garante que possa a estas regressar.
Artigo
14º
§1.
Toda pessoa, vítima de perseguição alucinatória, tem o direito
ser ouvido.
Artigo
15º
§1.
Toda pessoa tem direito a uma irracionalidade.
§2.
Ninguém será arbitrariamente privado de sua desrazão, nem do
direito de mudar de opinião.
Artigo
16º
Os
homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça,
nacionalidade ou religião, têm o direito de entrar em análise.
Gozam de iguais avessos, pois o sujeito do inconsciente não
envelhece.
§1.
A análise não será válida senão com desejo dos analisantes.
§2.
A família é o núcleo social e fundamental da neurose.
Artigo
17º
§1.
Toda pessoa tem direito a sonhar, só em sociedade com o infantil.
§2.
Ninguém será arbitrariamente privado de sonhar.
Artigo
18º
Toda
pessoa tem direito à liberdade de associação e inconsciência;
estes direitos incluem a liberdade falar sem selecionar o que vier à
cabeça.
Artigo
19º
Toda
pessoa tem direito à liberdade de opinião; este direito inclui a
liberdade de, sem interferência, procurar, receber e transmitir
informações sobre psicanálise.
Artigo
20º
§1.
Ninguém pode ser obrigado a fazer associação livre, é preciso
desejar.
Artigo
21º
§1.
Toda pessoa tem o direito de tentar tomar parte no governo de seu
sintoma, diretamente (se conseguir) ou por intermédio de um analista
livremente escolhido.
§2.
O desejo inconsciente será a base do processo analítico; este
desejo será expresso em atos falhos, chistes, sonhos, sintomas,
transferência, etc..
Artigo
22º
Toda
pessoa, como membro da sociedade, tem avesso e, portanto, sabe do
mal-estar inerente a ela.
Artigo
23º
§1.
Toda pessoa tem direito ao desejo, à livre escolha de analista, a
condições justas de valor de sessão, condições de trabalho
analítico e à busca por proteção contra o desamparo e à
angústia, o que não é garantido pelo analista.
§2.
Toda pessoa tem direito a organizar e desorganizar seu discurso
como bem entender.
Artigo
24º
Toda
pessoa tem direito a repouso, inclusive a limitação razoável das
horas de trabalho analítico e a férias periódicas.
Artigo
25º
§2.
A maternidade e a infância também são construções sociais e
históricas. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora de
matrimônio, podem ser desejadas ou não, mas nascem num ninho de
significantes que marcarão sua história.
Artigo
26º
§1.
Toda pessoa tem direito ao saber.
§2.
O saber depende do desejo e será orientado no sentido do respeito
pelos avessos humanos. A instrução nem sempre, ou quase
nunca, promoverá a compreensão, a tolerância entre e grupos em
prol da manutenção da paz.
Artigo
27º
§1.
Toda pessoa deveria participar da vida cultural, de fruir as
artes, da música, da literatura, etc.
§2.
Toda pessoa tem direito à proteção dos interesses morais e
materiais decorrentes de qualquer produção científica, literária,
artística ou sintomática da qual seja autor.
Artigo
28º
Toda
pessoa tem direito a uma ordem social e a uma desordem individual, em
que os avessos e liberdades de associação estabelecidos na presente
Declaração possam ser minimamente realizados.
Artigo
29º
§1.
Toda pessoa tem deveres para com seus sintomas.
§2.
No exercício de seus avessos, toda pessoa estará sujeita às
limitações determinadas pela lei paterna, com o fim de assegurar o
devido reconhecimento do Outro.
§3.
Esses avessos não podem, em hipótese alguma, ser exercidos
contrariamente aos propósitos e princípios de cada sujeito.
Artigo
30º
Nenhuma
disposição da presente Declaração pode ser interpretada de
maneira selvagem.
Campo
Grande, 10 de outubro de 2012.
Mais palavras costuradas de Isloany
Machado no seu blog
Isloany
Machado é
Psicanalista, Psicóloga,
membro da Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano-MS.
Especialista em Direitos Humanos pela UFGD
e
em Avessos Humanos pelo Ágora
Instituto Lacaniano.
Mestranda em Psicologia pela UFMS.
Despensadora da ciência e costuradora de palavras por opção.