de
Fernanda
de Barros Miranda
Não
é exagero eu dizer, que desde o maravilhoso longa de Almodovar: "A
pele que habito", um filme não me deixa tão pensativa, tão
angustiada, e por que não dizer com tanto medo.
"Garota
Exemplar, adaptação do livro de Gillian Flynn, que por sinal é
roteirista do filme, traz o suspense e as manobras que os fãs de
David Fincher já estão acostumados a ver em série como "house
of cards", ou grandes sucessos de bilheteria como a trilogia
"Millenium", ou "O curioso caso de Benjamin Button".
Amy
Dunne interpretada pela linda Rosamund Pike, é a filha, esposa, e
personagem exemplar... No dia de suas bodas com o marido Nick (Ben
Affleck), ela desaparece deixando-o como principal suspeito, ao mesmo
tempo que ele se angustia por seu paradeiro.
Às
voltas com o "crime", que parece ser o foco central do
filme, vai desenrolando o que pra mim é o cerne do enredo em si. Ser
exemplar, remete-se a pergunta, exemplar pra quem? E isso nos faz
pensar numa posição sedimentada pelos ideais paternos, ideais da
cultura e da sociedade.
Até
aí nenhuma grande novidade, vários filmes (até os mais charlatões
de Woody Allen) já trataram do assunto, mas o ousado olhar desse
longa é o que está por detrás de tanto
"exemplo", o que fica recalcado, negado, ignorado por quem
busca ser exemplar e quão assustador e perigoso pode ser quando
tudo isso vem a tona de uma pessoa que não conseguiu escapar desse
aniquilador ideal.
Ser
exemplar, é a representação da mais pura recusa à castração. No
caso de Amy, ela se mostra um indivíduo (porque talvez seja
impossível se referir a um sujeito) tão perfeito e completo, que é
incapaz de aceitar as frustrações e decepções causadas por perda
de emprego/ dinheiro, o fim de um casamento que parecia ser perfeito
aos olhos da sociedade, e de uma vida simples e suburbana longe de
Nova Iorque.
Nos
faz pensar que "tentar", (e digo tentar porque a meta é
inatingível ) corresponder a esses ideais paternos, é antes de mais
nada a impossibilidade de se tornar sujeito de si mesmo. A saída é
a psico ou sociopatia, e esse estado se faz assim tão atormentador,
tão assustador.
O
psicopata tem em si plena capacidade de convívio social,
mostrando-se cortez, simpático, amabile... Tudo faz parte de uma
enorme edificação psicológica para seu grande e perverso projeto.
A
mentira é das armas mais venenosas que esse tipo de pessoas faz uso,
e o que estão em volta, se uma vez dentro dessa mentira,
dificilmente sairá dela. É um espiral concomitante de medo, raiva,
aprisionamento, que vai fazendo aos tubos vítimas fatais.
"Garota
exemplar" é o lado sombrio de cada um de nós, e por que não
seria de quem está aí nesse momento, bem ao seu lado?
A
nós pobres mortais, a sorte de não sermos tão exemplares assim.
Trailer do filme
Fernanda de Barros Miranda é Educadora física, Naturopata e Psicanalista. Membro da rede de atendimento do Centro de Estudos Psicanalíticos - CEP.
Um comentário:
... o indizível ilimitado que "vem depressa"... e dilacera aniquila pra permanecer.
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