de Arnaldo Domínguez de Oliveira
Uma
compulsão é alguma coisa que empurra – zwang
– à repetição de dizer, fazer ou pensar alguma coisa. Compete a
nós, psicanalistas, “domar a compulsão de repetição” e
transformá-la em motivo para recordação na ‘neurose de
transferência’, uma neurose artificial.
Será
também de nossa competência apoiar o fechamento do vão livre do
MASP contra a invasão dos “craqueiros” e outros tipos
indesejáveis? – lugar onde eu próprio conheci nos anos oitenta,
um “Orixá” graças a cuja intervenção posso ainda estar neste
país. Talvez sim. Hoje em dia eu nem frequentaria esse lugar urbano
em horários impróprios.
Os
humanos – segundo Freud em Novas Recomendações Sobre a Técnica,
1913 – somos a miúde adeptos à “política do avestruz”.
Digamos, à razão cínica pela via da Bela Indiferença ou da Alma
Bela. Seremos, então, os psicanalistas os domadores que colocaremos
às rédeas da transferência nas pulsões indomadas? Entretanto,
posto que o analisante não reproduzirá o esquecido ou recalcado
como lembrança, senão que o atuará,
ele não poderá se livrar da compulsão à repetição por ser o
modo de recordar de que dispõe.
Em
1932, por ocasião das Novas Conferências apenas escritas em plena
crise de falência da editora da IPA – quando esse autor acreditava
produzir seu último livro – Freud associou os “sonhos de
punição” ao supereu e os ”sonhos de angústia” à Compulsão
de Repetição já ligada à Pulsão de Morte no Mais Além do
Princípio do Prazer de 1920.
Ele
próprio parece-me que se livrava da angústia da temporariedade numa
compulsão pela escrita. (Tomara que nos contagiemos deste sintoma).
E assim Freud enviou uma carta para Max Eitingon em 20 de março de
1932, onde dizia: “Sempre
se deve estar fazendo alguma coisa, mesmo com o risco de ser
interrompido – mais vale isso do que desaparecer em estado de
preguiça”.
E
por falar sobre a escrita eu assisti ontem (28 de novembro de 2013)
no Teatro Paulo Autran, em São Paulo, o “Lado A” da peça
“Puzzle”, dirigida por Felipe Hirsch. Um quebra-cabeça em três
partes (A, B e C) apresentado para o Programa Brasil Convidado de
Honra da Feira do Livro de Frankfurt neste mesmo ano. Um Brasil já
não mais colorido, como àquele dos tempos de Carmem Miranda, senão
o atual, em branco e preto.
Cíntia
Moscovich na Zero Hora comentou: “’Puzzle’
mostra na Alemanha um Brasil tão de verdade que chega a ser
constrangedor: sem concessão alguma”.
Hoje
eu penso que Genet resulta quase ingênuo perante a
“literobucetalidade” de uma escritora ou frente ao
discurso de nossos guardiões da ordem estabelecida que gritam: “que
se foda toda metapsicologia”. “A gente é burra mesmo!”. Aliás,
“burros” porque somos machos!
Eu
já havia redigido o texto que segue antes do espetáculo e vivi um
déjavú
ao
experimentá-lo.
Pois
bem, vamos enfrente, não fui inibido por isso, senão que me senti
empurrado: “O
leitor abrirá Nossa Senhora das Flores como se abrisse um armário
de um fetichista e encontrará ai, dispostas nas prateleiras, como
sapatos que foram cheirados e beijados e mordidos cem vezes, as
palavras úmidas e perversas que brilham com a excitação que elas
despertam em outra pessoa e que nós não podemos sentir”.
Jean-Paul
Sartre
.Os
sonidos do silêncio. As
palavras a que Sartre se refere ao apresentar o livro de Jean Genet,
“Nossa Senhora das Flores” (Ed. Nova Fronteira) são
materializações de uma
Wiederholungszwang
(compulsão à repetição no dito ou na escrita), que se manifestam
em letras substitutas dos objetos fetiches tais como seriam os
sapatos mordidos. Digamos, então, que falar também é um gozo e que
tais palavras gozadas podem comparecer na cena dialética para
fornecer um brilho de excitação que muitos não poderemos sentir,
mas poderemos escutar se suportarmos o silêncio presente nos
meandros. Destas materializações Freud certamente condensaria em
nota de rodapé nos Três ensaios: As
fantasias claramente conscientes dos perversos (que, em
circunstâncias favoráveis podem transformar-se em atos), os temores
delirantes dos paranoicos (projetados em outrem num sentido hostil),
e as fantasias inconscientes dos histéricos (descobertas por trás
de seus sintomas através da psicanálise) e coincidindo até os
mínimos detalhes em seu conteúdo. Entretanto,
a teorização tantas vezes assumirá também um teor compulsivo
invasor, por exemplo – em nossa prática psicanalítica – dos
escritos, dos debates, das supervisões em grupo, etc., quiçá
visando por um lado, preencher todas as frestas de angustia que o não
saber produz em nós e por outro, provavelmente, seduzir o
interlocutor quando posicionado nos extremos lugares de + 1 ou de não
saber interessado (histérico). Seja como for, a clínica sempre se
sobrepõe instrutiva para o bom escutador. Em nosso campo de
investigação privilegiado pela relação transferencial a histérica
insiste em nos tornar mestres e é expert
em encurralar-nos contra a parede para exigir a produção de um
saber. Decifra-me ou me devoro! Assim era enunciada a ameaça
autopunitiva forjada pelos excessos de uma mulher obesa cuja demanda
era endereçada a mim.
Em
contrapartida, o perverso anuncia – pleno de mestria – seu
direito ao gozo. Assim gravou uma mensagem em minha Caixa Postal do
telefone fixo: “Yo
tengo derecho a chuparte la pija y quiero saber quién será el hijo
de puta que me podrá impedir!”,
e essa enunciação de “direito” (do mal) representava o grito
proferido depois que o paciente fora informado sobre meu recurso às
leis jurídicas para me defender de sua ameaça erotomaníaca e de
sua denúncia no Conselho Regional de Medicina alegando que eu o
teria “seduzido no divã”, o que lho autorizava ao usufruto do
caráter descrito por Freud (sem mencionar o Édipo): As
Exceções.
Antes do ato me fizera saber que, em sua adolescência havia perdido
uma importante bolsa de estudos e fora detido (e humilhado) na
delegacia de polícia ao ser encontrado praticando a fellatio
no
namorado da professora de Geografia (dele). Seu pai concordara
plenamente com tal punição e sua mãe, que foi, durante a infância
dele, amante do médico da pequena cidade utilizando-o como álibi
perante as eventuais suspeitas do marido, desta vez não demonstrou a
cumplicidade (devida) esperada por ele, pois se inverteu a dívida
simbólica.
Escreveu
Freud nos Três Ensaios: “O
caráter histérico permite identificar um grau de ‘recalcamento
sexual’ que ultrapassa a medida normal... Esse traço de caráter,
tão essencial na histeria, não raro escapa à observação casual,
ficando encoberto pelo segundo fator constitucional da histeria, ou
seja, o desenvolvimento desmedido da pulsão sexual;... enigmática
contradição – par de opostos – uma necessidade sexual desmedida
e uma excessiva renúncia ao sexual”.
Não
podemos esquecer que, para Freud, a fantasia (fantasma perverso) é
positiva (consciente) na perversão e negativa (inconsciente) na
neurose.
E
na psicose retorna desde fora onde foi projetada de maneira hostil:
uma paciente que vinha regularmente às sessões em que estava
terminantemente proibida (por ela e por seu delírio) a emissão de
qualquer som ensinou-se duramente a dar suporte a todo o seu silêncio
constrangedor e ajudou-me a constatar que eu poderia suportar o meu
próprio silêncio. Por outro lado, uma analisante de elevada
formação intelectual me advertiu durante uma sessão: -
Não leve tão em sério as minhas arguições. Elas, muitas vezes,
se exibem usando lingerie vermelho!
Contudo,
suportar os silêncios não é tarefa muito simples. Ainda mais,
quando eles se apresentarem na forma de desafios, pois nestes casos
competirá ao analista fazê-los falar ou calar, dependendo da
motivação. Cito como exemplo, o torpedo enviado por outra
analisante que disse: -
Desculpe, eu não vou... desculpe por perturba-lo... Agradeço mais
não vou... Eu só quero desaparecer e silenciar
E
essa proposta de silêncio seria um grito de desespero ou uma
constatação suicida? Há um ruído que pode ser ensurdecedor nestes
silêncios. Os humanos somos muito ruidosos porque a pulsão sexual,
mesmo surgindo na calada da noite, é sempre barulhenta. Apesar de
que quando se mostrar charlatã pode também nos enganar com uma
roupa que não conseguiremos ver se não pudermos fechar os olhos (da
pulsão) onde o rei está nu!
Primum
non nocere!
“Os
antigos celebravam a pulsão e se dispunham a enobrecer com ela até
mesmo um objeto inferior, enquanto nós menosprezamos a atividade
pulsional em si e só permitimos que seja desculpada pelos méritos
do objeto”, Freud,
Três Ensaios – Nota de rodapé acrescentada em 1910.
O
tema do diagnóstico em psicanálise é sempre um assunto de grande
relevância, sobre tudo, para que não provoquemos surtos psicóticos
por imperícia. Mas, muitas vezes, tal debate pode apresentar-se qual
um modo de tamponar o que falta: o não saber. No discurso da
sexologia oitocentista e persistindo ainda na teoria freudiana, a
perversão referia-se às condutas sexuais cuja finalidade era
diferente da procriação. O avanço promovido pela psicanálise
consistiu em torna-la um elemento sempre presente seja de maneira
negativa ou positiva, em todos nós.
Para
Lacan, no Seminário IV (As relações de objeto), a perversão está
considerada em relação ao falo e à identificação. O paradigma é
o fetichismo, pois o fetichista se identifica com o falo como objeto
imaginário que completa o desejo materno. Primeira fase do Complexo
de Édipo (Seminário V, As formações do inconsciente). Ser ou não
Ser, 1957/58. No Seminário X, sobre a Angústia, o falo será o
significante do desejo, causa do desejo: objeto ‘a’ e muda assim
o estatuto do fetiche que passou de “ser o falo” a ser o “objeto
causa do desejo”. No Seminário XVI (De um outro ao Outro), Lacan
eleva a perversão ao grau de estrutura. Posição do sujeito
perverso: identificação com o objeto ‘a’ para servir, de tal
maneira, como instrumento do Gozo do Outro. Um bom exemplo disto é o
discurso de Feliciano no atual comando da Comissão de Direitos
Humanos no Planalto Central do país com cinco mil alto falantes!
Eu
acrescentarei aqui, a estes critérios lacanianos para pensarmos
sobre a perversão, a constatação discursiva da negação da
alteridade e, em consequência, da subjetividade que constitui o
outro enquanto tal, diferente de mim, indo, assim, do sexual ao
social.
Digamos
como exemplo, Maluf ao relatar sua lua de mel ocorrida há 58 anos
antes da entrevista diz: eu me casei em tal data, viajei para tais e
tais lugares, fiquei em tais hotéis, etc. Parece-nos que a esposa
não participou dessa experiência, ao menos no discurso dele não há
lugar para isso. É o UM de dois.
Pois
bem: sob a desconfiança diagnóstica de “perversão” foi
apresentado, numa “hora clínica” (no CEP), um recorte referente
ao atendimento de uma mulher casada com seu primo irmão quem também
tinha um caso amoroso com a cunhada (irmã da esposa) dentro da
residência do casal. Ela, por sua vez, iniciara um relacionamento
com um Policial Militar, guarda da creche onde deixava o filho. Os
encontros sexuais aconteciam pela manhã e dentro do carro dela. O
marido, desconfiado, colocou uma escuta no carro e descobriu tudo.
Depois disso, ele ficou ainda mais apaixonado e excitado o que o fez
procurá-la sexualmente a toda hora. Assim, entre o policial pela
manhã e o marido à tarde e à noite, ela chegou à análise
chorando e se queixando:
-
Não aguento mais transar!
Porém,
não conseguia parar, afinal, o marido afirmara: “Você é uma
mulher muito gostosa para ser somente minha!”. E a analista pensou:
“o homem se reconhece amando quando sente ciúmes”?
Não
conseguir parar coloca a questão desta mulher numa dimensão
temporal. É o tempo que não para!
Conforme
Hegel, o primeiro monista, a temporalidade está incluída na razão
no pensamento ocidental. Na origem do ser se encontra o espírito
(existência em si). Para ir em direção a si o ser tem que se
expressar: dirigir-se à matéria> natureza> história>
homem> consciência> filosofia> e por fim, numa elipse
recuperar a história do espírito. Em Hegel, o desejo é sempre
desejo de desejo (Fenomenologia do espírito). Já para Marx o
espírito surge como expressão da consciência humana e não como a
origem. Lacan demonstrou como o Eu vem de fora, no Estádio do
Espelho, sendo uma ilusão na qual eu me alieno para poder me
reconhecer: quem sou eu?
Quero
dizer com isto que
“o princípio de identidade é diferente para a psicanálise e para
a ciência, com o qual digo que a psicanálise não é uma ciência”
afirmou
Graciela Brodsky em Córdoba (16 de outubro de 2006) ao falar sobre
“A diferença sexual na experiência analítica”.
Para
a psicanálise freudiana, o espírito que age inconscientemente na
sobredeterminação do funcionamento do Eu é a Fantasia Inconsciente
- o Fantasma - realidade do inconsciente enquanto sexualidade (falta
em ser). E é próprio da lógica do Fantasma que os sujeitos
inventemos um lugar incestuoso que funcione qual “identidade”
destinada a negar a falta. Nesse caso relatado pela paciente foi: a
“gostosa”.
A
proposta do fantasma é a realização do incesto e como múltiplos
fantasmas em massa constituirão o social e possível supor que a
realidade social em que estamos inseridos tenha estrutura
fantasmática regressiva, ou seja, contra a lei. Podemos afirmar que
esse social seja um estado de exceção: de destruição. Ou, pelo
menos, um estado pleno de direitos (sem deveres) para alguns
“eleitos” representantes da Vox Pópuli. Um estado de perversão.
Por isso é fundamental, de acordo com Freud, que exista ao menos uma
lei reguladora que controle o mal estar na civilização: não
matarás! Entretanto, essa lei falta (falha) em muitas circunstâncias
em nossa cultura o que faz com que nos tornemos cada vez mais
“matáveis” conforme afirma Giorgio Agamben em seu escrito sobre
o Homo Sacer e a vida nua.
Ao
dizer de Albert Camus sobre o mito de Sísifo, é essa dor sem
escolha (dor de existir) que o obriga a realizar um trabalho inútil
e sem esperança e o transforma em proletário dos deuses, trágico
porque consciente: “a tragédia começa no momento em que se sabe”.
Daí a importância que eu outorgo ao citar sempre o imperativo
categórico formulado pela mãe romena do meu amigo Schlomo: melhor
você não sabe!
A paixão pela ignorância que pretende defender pela via do
verleugnung
(desmentido) que A
vida é bela!
E
eis que começou a tragédia dessa analisante “gostosa” porque
veio para construir um saber. O que também a situa dentro da
perspectiva ética do desejo. Veio em busca da lei do desejo para
escapar da lei do gozo.
Comparemos,
então, este breve relato clínico com uma matéria publicada na
http://revistatrip.uol.com.br/revista/179/reportagens/Ruth-pega-geral.html,
em 01/10/2013 e que me foi sugerida pelo jornalista Romulo Osthues, a
quem agradeço profundamente.
Ruth
pega geral:
Ruth, 52 anos, professora, transa com até 41 homens numa noite sem
cobrar e sem perder o tesão. São sessões de gang
bang.
Durante a reportagem um homem sai cambaleando da suíte nomeada “O
cantinho da Ruth” e desabafa: “Porra,
merrrmão, foi surra de boceta, foi surra!”.
Quem bateu no grandalhão foi Ruth! Escreve Lino Bocchini na revista,
como se fosse um espetáculo de luta. E talvez o seja, não?
Novamente
o tempo: “A
celulite já está aparecendo, e as ruguinhas também... mas os
peitinhos continuam em pé e a bundinha, durinha, fazendo o maior
sucesso. A vontade de trepar segue no auge, e minha resistência para
ser fodida diversas vezes seguidas não diminuiu. Aliás, acho que
aumentou!”
Ela
se tornou uma celebridade na cena swinger
carioca
e na internet ganhou fama como Ruth36. O marido explica que é por
ter transado com 36 homens numa noite só, mas já bateu o recorde.
Agora são 41.
A
explicação de Ruth sobre as origens desse espírito erótico está
na infância, quando brincava de médico com os meninos do prédio.
“Hoje
eu adoro quando tem uma meia dúzia de homens em torno de mim, me
usando e abusando”. Festas
liberais! Sou total flex! (Homens e mulheres), afirma Ruth.
As
pessoas podem assistir tudo o que rola dentro do Cantinho da Ruth
através de um vidro e sentadas confortavelmente em uma sala de
estar.
Ruth
aguarda com ansiedade as quintas feiras, quando tudo acontece e ela
tem que estar “gostosona”. Gosta de se definir como uma
“exibicionista completa”. Conta com alegria como teve um caso
amoroso com oito fuzileiros navais ao mesmo tempo. De acordo com o
repórter, narra isto com a mesma naturalidade com que poderia falar
sobre o café. Na última quinta – diz – morreu de prazer durante
um gang bang anal com 15 homens.
Todavia,
considera que as melhores transas da noite são, depois, com o marido
que não tem ciúmes em absoluto. Porém, faz uma ressalva: evita o
sexo quando está menstruada.
A
matéria esclarece: se trata de um casal de vida social normal,
profissionalmente bem sucedido, pais dedicados e, além disso, muito
educados e simpáticos.
Mas
o marido alerta: “Ela
gosta de carinho, de cuidadinho. E não gosta dessa história de tapa
na bunda, que puxem o cabelo ou apertem o bico do peito muito forte.
Isso corta o barato dela”.
E
assim falava Ruth VIP: a Very Important Puta.
Finalmente
a reportagem dá a palavra aos psicanalistas, que explicarão:
relação anaclítica, Mauro Hegenberg, sem querer ser politicamente
incorreto. Insaciabilidade e voyeurismo constituiria o casal, sendo o
único limite, a menstruação. Sueli Gevertz. Ruth oferece de graça
aquilo que a sociedade de consumo cobra, diz Jacob Pinheiro Goldberg.
Ruth tem uma compulsão, conclui Luiz Alberto Hans. E postula uma
contabilidade que para mim soa estranha: transar com cinco é uma
coisa, já com 30 é outra. (?)
Os
psicanalistas também gostamos muito de falar e às vezes beiramos
pelas bordas de certo exibicionismo. Quiçá seja porque o
dispositivo nos obrigue a permanecer tanto tempo em silêncio.
Todavia, neste caso, Ruth não quer saber (não demandou nenhuma
explicação, pois ela “sabe” gozar) e é provável até que se
divirta com os disseres dos peritos. Porque, para Ruth (a despeito de
Lacan) a Relação Sexual existe! E é nessa tão estranha
contabilidade incompreendida por Hans – para ela, certamente, um
pequeno Hans – que ambos (ela e seu marido) realizam em Áurea
Proporção, o encontro com o Número de Ouro da substância gozante:
o objeto “a”. E a perspectiva da Castração apenas acena marcada
numa existência temporal (futura) que será postergada enquanto a
bundinha e os peitinhos permanecerem duros. Ou seja, enquanto possa
se manter – dentro de uma lógica masculina – a Idade Viril.
Eu
desconfio que seja dentro desta lógica que assim caminhe a
humanidade globalizada. E que esta represente a tal corrida contra o
tempo proposta pelo capitalismo tardio, pós-modernidade,
globalização, neoliberalismo, para todos os proletários, atuada
por Ruth36 às quintas feiras num jogo incessante de repetição que
não resulta tão estranho se nós levarmos em consideração a parte
que nos cabe neste latifúndio da existência contemporânea. Como
define Bauman, tão líquida. Tanto, que escorre pelo vão de nossos
dedos entrelaçados. Afinal, embora ainda não fôssemos capazes de
inventar algum novo discurso eficaz sobre o amor, já tornamos a
enobrecer a pulsão, como os antigos, mas quiçá só gozemos
degradando o objeto.
Itaquaciara, 16 de novembro de 2013
Arnaldo Domínguez de Oliveira é Psicanalista e Professor do CEP - Centro de Estudos Psicanalíticos, fundador do PROJETO ETCÉTERA E TAL... Psicanálise e Sociedade, conselheiro da Biblioteca Popular de Itaquaciara D.Nélida e médico de formação.
Itaquaciara, 16 de novembro de 2013
Arnaldo Domínguez de Oliveira é Psicanalista e Professor do CEP - Centro de Estudos Psicanalíticos, fundador do PROJETO ETCÉTERA E TAL... Psicanálise e Sociedade, conselheiro da Biblioteca Popular de Itaquaciara D.Nélida e médico de formação.
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